sábado, agosto 26, 2006

Pode me chamar de ice cream



Tem gente que não bota muita fé no ser humano. Mas é preciso admitir que essa raça atinge momentos de altíssima sensibilidade, entre um ímpeto de autodestruição e outro. Afinal, foram homens e mulheres que construíram Brasília (a foto é do Marcel Gautherot), escreveram a Declaração Universal dos Direitos Humanos e inventaram a feijoada. Até o Alceu, que aparentemente não é um sujeito muito privilegiado, conseguiu fazer sua obra-prima.

A Joyce também não parece ser das figuras mais brilhantes da humanidade. Nasceu bossanovista, um pecado de origem praticamente imperdoável, e ganha a vida até hoje no circuito internacional do ritmo “brasileiro”. Hoje ela faz mais “sucesso” lá fora do que aqui, após um breve período de popularidade, nos anos 80.

A carreira deu um salto lá fora no início da década de 90, a partir do momento em que algum infeliz resolveu adicionar uma pitada de música eletrônica à bossa nova. Uma praga que está aí até hoje em qualquer sala de espera “modernosa”, mas eu não estou aqui pra falar do lado decadente da Joyce.

Muito antes de entregar os pontos e fazer bossa pra japonês ouvir, ela pegou o violão (ou o caderninho, sei lá), e escreveu um clássico absoluto, “Abrace Paul McCartney por Mim”. É um ponto totalmente fora da curva de sua carreira de compositora, que para dizer bem a verdade eu conheço superficialmente e não tenho lá grande vontade de me aprofundar.

Curiosamente, Joyce não gravou esse tesouro – pelo menos as discografias disponíveis dela (aqui e aqui) não registram que ela o tenha feito. Conheço duas versões: a de Evinha, absoluta, de 1970; e a do grupo-armação Umas e Outras (forjado por Nelson Motta, que como se vê faz MUITO tempo que engana nesse ramo), também de 1970.

A letra é simples, comovente. Uma moça de coração partido. Talvez porque o noivo tenha partido para Londres. Uma garota que tem a grandeza de espírito de chamar seu amado de “ice cream” (eu não teria ido pra Inglaterra, sinceramente). E que pede pra ele dar um abraço no Paul McCartney, já que tudo está perdido mesmo...

A letra ("tirada" por mim, desculpe qualquer incorreção) segue abaixo. Os arquivos são fáceis de achar no SoulSeek. Pra quem não usa o software mais bacana que a humanidade (sempre ela...) já inventou, baixe por a da Evinha aqui e a do Umas e Outras aqui. (Jota Peene)

Abrace Paul McCartney por Mim (Joyce)

Sinceramente eu queria
Sem outra intenção
Me lembrar do que quase esqueci
De como vai você
Se mudou
Ou se você ainda usa a mesma calça Lee

Meu amor, meu ice cream
Abrace Paul McCartney por mim

Eu por enquanto vou bem
Viajando no espaço
E às vezes lembro de você
E por que não dizer?
Sou feliz
Quase feliz
Da maneira que a gente quis ser

Um comentário:

Rebeca disse...

Pronto, vocês conseguiram. A menina aqui não consegue parar de ouvir "meu amoooor, meu ice cream".

E eu concordo, JP, só uma pessoa em elevadíssimo estado de espírito pode chamar alguém de "meu ice cream". Sensacional.

bjos